Cartaz/programa do espetáculo que estreou em 01 de Dezembro de 1982, no Teatro Casa Grande, Rio (44,5cm x 62cm)

Barra

(INFORMAÇÕES CARTAZ/PROGRAMA)

(Frente)

CAPITÃES DA AREIA

Jorge Amado

Teatro Casa Grande

Estreia 1º de Dezembro

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(Verso)

Os Capitães da Areia no palco

Jorge Amado

Há quarenta e cinco anos, em 1937, foi publicada a primeira edição do livro de minha autoria. Capitães da Areia, alguns dias antes do golpe de Estado que resultou na ditadura do “Estado Novo”. O romance das crianças abandonadas nas ruas da cidade da Bahia, imediatamente colocado no index pelo regime de corte fascistizantes, teve a edição apreendida mais de dois mil exemplares queimados em praça pública – com ata e tudo – em Salvador, outros tantos em São Paulo: os exemplares que escaparam do fogo, foram vendidos pelos policiais as escondidas e a alto preço. Somente em 1944, quando a dferrota das forças do nazifacismo se tornava evidente nos campos de guerra da Europa, o livro voltou às livrarias, durante sete anos todos os meus livros – não apenas Capitães da Areia – estiveram fora de circulação.

Agora, quarenta e cinco anos depois da primeira edição, lançada por José Olympio e das fogueiras que consumiram os volumes com a bela capa de Santa Rosa, os Capitães da Areia estão mais vivos do que nunca no palco do teatro Castro Alves onde estréia hoje adaptação teatral do romance feita por Carlos Wilson. Encenada por ele, com a colaboração de magnífica equipe, a cuja frente está Regina Sampaio, produtora executiva; contando com o talento e o entusiasmo de uma extraordinária meninada, atores de primeira ordem todos eles, de Roberto Battaglin que vive Pedro Bala até Bebel, a filha apenas adolescente de Miucha e João Gilberto e citando esses dois nomes estou citando o nome de todo o elenco cuja unidade e qualidade vai merecer, tenho certeza, os aplausos vibrantes do público da Bahia.

Os aplausos da crítica e do público do Rio de Janeiro, eles o conquistaram em impressionante unanimidade. Todos os que escreveram sobre a peça, fizeram-lhe os mais rasgados elogios e grande público, durante cinco meses, superlotou os teatros onde foi apresentada. Houve quem a visse oito e 10 vezes – e a maior beleza é a idade desse publico: jovens, adolescentes, meninos e meninas.

Muitas alegrias me deu esse livro: possui enorme audiência no Brasil e fora do Brasil, traduzido em mais de 20 línguas; adaptado para o cinema nos Estados Unidos pelo produtor e diretor Hall Bartlet; adaptado para televisão na Tchecoslováquia; para o teatro na Alemanha; a adaptação teatral de Carlos Wilson é a quinta feita no Brasil.

Nenhuma alegria maior, porém, me deram os Capitães da Areia do que a da noite de 27 de julho quando assisti no Teatro Ipanema, esse grupo de jovens viver para um público de jovens, a condição terrível dos Capitães da Areia, com verdade e poesia, com solidariedade e humanismo, com intensa paixão. Poucas vezes em minha vida senti-me tão comovido. Quero agradecer aqui a todos que colaboraram no espetáculo.

Os que me conhecem, sabem que não faz parte de meus hábitos recomendar meus livros aos leitores – quem os recomenda é o editor que o fabrica e vende. Não sou, tampouco, de criticar e negar qualidades as adaptações de obras de minha autoria mesmo quando não me parecem bem realizadas. No caso atual, porém, saio dos meus hábitos para recomendar ao público baiano a peça que Carlos Wilson realizou partindo do texto de Capitães da Areia. Realmente ele obteve uma criação teatral da mais alta qualidade e reuniu uma equipe e um elenco excepcionais. Algo fora de série. Vale a pena ver a peça. Estou certo de que nenhum espectador sairá decepcionado. Muito pelo contrário, aqueles que forem ao Teatro Castro Alves, ficarão com certeza felizes por assistir a um espetáculo onde a solidariedade humana vence a miséria e a tristeza. Onde o amor se impõe sobre a violência e a maldade.

Teatro – Crítica

Capitães da Areia, um espetáculo de jovens fiéis ao velho Jorge Amado.

A fidelidade ao texto de Jorge Amado é uma qualidade do espetáculo do Tuca. Outra, a entrega total do elenco a seus personagens.

Um dos signos da vitalidade do teatro é o contínuo surgimento de elencos jovens, como a testemunhar um amor permanentemente renovado pela arte. Depois de cumprir bela carreira no Rio, acha-se em curta temporada, no Tuca, um grupo cuja idade média não deve superar os 20 anos, encenando Capitães da Areia, espetáculo extraído do romance de Jorge Amado.

A tarefa, como se sabe, enfrenta as maiores dificuldades, por se tratar de duas linguagens distintas. Mesmo, quando se fala em teatro épico, ou narrativo, tem-se em mente que o comentário, vem depois de uma ação dramática, tirando ligações daquilo que foi vivenciado pelo diálogo. Já no romance a narração ocupa o primeiro plano e o diálogo não se faz elemento constitutivo. O romancista quebra a continuidade narrativa, ilustrando-a vez por outra com o colóquio. Daí, o palco dificilmente vencer a impressão, ao adaptar um romance, de que apenas ilustra uma narrativa, certamente mais rica no original.

O trabalho que Carlos Wilson realizou padece um pouco de crítica genérica de que é passível a transposição dos gêneros. Eu afirmaria, sem medo de ser injusto, que o romance de Jorge Amado é melhor que sua adaptação cênica. É poética, bonita e emocionante a história desses meninos abandonados das ruas de Salvador, que sobrevivem de pequenos furtos e dormem num trapiche. Capitães da Areia (denominação pela qual são conhecidas essas crianças), romance da primeira fase do grande ficcionista baiano, resiste ao tempo e conserva uma cadente atualidade.

A primeira virtude da adaptação de Carlos Wilson está na absoluta fidelidade ao original. Ela acompanha passo a passo o desenvolvimento do entrecho e, na maioria dos casos, reproduz literalmente os diálogos do próprio Jorge. As simplificações são obrigatórias, em face da maior duração do romance e da liberdade oferecida pela narrativa. Carlos Wilson não quis “interpretar” o livro, limitando-se, sabiamente, a transpor para o palco o que era possível.

A qualidade maior da adaptação reside em que, ao risco de empobrecer o romance, ela preferiu o caminho de procurar uma equivalência cênica dos seus valores ficcionais. Assim, o espetáculo alcança vida autônoma, independente do livro, e trabalha uma emoção real, que se comunica a platéia. Acompanham-se com simpatia àquelas individualidades marcadas por sentimentos diferentes, de acordo com o ódio ou a mágoa ditados pela injusta marginalidade.

A montagem, fiel ao espírito do romance, mantém as características populares do universo retratado. O catolicismo profundo e atuante de padre José Pedro, criticado pela hierarquia eclesiástica, mistura-se a religiosidade africana do candomblé, naquele sincretismo tão típico da Bahia. Sem alarde, estão lado a lado a coragem sadia de Pedro Bala, a revolta de Sem Pernas, a vocação sacerdotal de pirulito, a malandragem de Gato, o talento pictórico do Professor, a inteireza de Dora, que morre e vira estrela. Jorge Amado não falseia nenhuma personagem e no seu mundo as mais contraditórias coexistem, unidas por pungente humanidade.

Carlos Wilson soube captar a atmosfera quente, generosa, sensual do romance, dando-lhe uma simples e direta representatividade cênica. Os numerosos ambientes do livro estão sugeridos apenas pelo diálogo e, de vez em quando, pela descrição de um narrador, já que seria impossível recria-los em cenários convencionais. Alguns músicos, presentes o tempo todo no palco, estabelecem ligações, agilizam o ritmo, asseguram a continuidade das cenas, dentro da inconfundível marca sonora da Bahia.

Embora inexperientes, padecendo de problemas de emissão vocal, os atores se beneficiam de apaixonada entrega aos papéis. Vê-se que passaram por séria preparação corporal, inclusive com plástico domínio da capoeira. A sensibilidade brasileira funcionou para que rapazes e moças da Zona Sul carioca reproduzissem tão autenticamente os capitães da areia de Salvador.

Roberto Battaglin (Pedro Bala), Bianca Byington (Dora), Paulo Nigri (Sem Pernas), Paulo Pontvianne (Boa Vida), Dedina Bernadelli (Doma Ester), Felipe Camargo (Gato), Iza do Eirado (Dalva) e muitos outros mostram a potencialidade capaz de transformá-la em verdadeiros profissionais.

Capitães da Areia vale, sobretudo, pelo desnudamento de um Brasil próximo e que nos recusamos com frequência a encarar.

Sábato Magaldi

Ficha Técnica

Autor: Jorge Amado
Adaptação: Carlos Wilson
Direção Musical: Carlos Cardoso
Direção Corporal: Cláudio Baltar
Figurinos: Carlos Wilson e Andréa Beltrão
Iluminação: Hugo Secco
Produção Executiva: Regina Sampaio
Assistente de Produção: Claudia Sampaio
Músicos: Carlos Cardoso, Tereza de oliveira, Sergio Treiger
Percursionistas e Capoeiristas: Adail de Oliveira, Sérgio Sales
Adereços: Cláudia Sampaio
Operador de Luz: Hugo Secco
Execução de Figurinos: D. Dina
Fotografia: Guga Melgar e Luiz Affonso
Direção Geral: Carlos Wilson

Elenco

Alexandre Frota: João Grande
Bianca Byington: Dora
Bruno Fernandes: Nhozinho França, Jornaleiro
Dedina Bernadelli: D. Ester, Cantora
Enrique Dias: Zé Fuinha
Fernando Pires: João de Adão, Joel, Arcebispo, Sr. Raul
Felipe Martins: Professor
Felipe Camargo: Gato
Iza do Eirado: Dalva, D.Aninha, Menina do Areal
Júlio Freire: Padre José Pedro
Maurício Mattar: Narrador, Ezequiel, Lampião
Marcelo Mattar: Emanuel, Almiro
Maria Stella Oliveira: Bruaca, Maria Bonita, Comadre Luiza, D. Laura
Paulo Nigri: Sem Pernas
Paulo Pontvianne: Boa Vida
Roberto Battaglin: Pedro Bala
Roberto Bomtempo: Pirulito, Bêbado, Delegado
Roney Villela: Volta Seca
Sérgio Henrique Sales: Querido de Deus
Victor Lott: Barandão, Guarda

Apoio Cultural

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