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O teatro traz na sua essência o jogo, o mágico e o poder de espelhar a realidade. Caracteriza-se, sobretudo, por proporcionar uma vivência metafísica entre atores e plateia. Nesta vivência, os pensamentos e sentimentos tomam corpo através dos vários recursos ou elementos que esta atividade dispõe, ou seja: o texto, a representação propriamente dita, somados a cenários, figurinos, iluminação, sonoplastia, etc.

Pode-se fechar os olhos, imaginar uma história, cena ou situação dramática, agregar a imagem àqueles recursos todos e, com uma varinha mágica, ordenar-Ihemovimento. Pronto! Abres-se a cortina e aparece a criação expressa no palco.

Este poder, esta mágica, vem carregada de intensidade por ser baseada numa relação de pessoa para pessoa. O teatro é uma arte intensa e efêmera, cujo valor reside no confronto e na cumplicidade palco-plateia.

Todos estes fatores tornam-se relevantes se a plateia for composta por seres cuja principal característica é à vontade de conhecer e indagar o mundo. O nível de importância que a criança dá as coisas, por estar num processo constante de compreensão e apreensão do mundo, faz com que as virtudes da arte dramática se ampliem e adquiram um caráter, onde o conhecimento venha revestido da relação prazerosa, que a rigor deve ocorrer no teatro.

O teatro exerce na criança motivação interior e exterior, que desperta satisfações de ordem psíquica.

O teatro vai iniciar a criança numa arte, colocando-a diante de uma das mais antigas manifestações culturais. O espetáculo teatral vai introduzi-Ia num mundo de convenções e signos, onde as inquietudes humanas são apresentadas.

O teatro, como arte, vai solicitar da criança uma serie de reflexões e vai ajuda-Ia a buscar respostas para suas indagações existenciais e compreensão do cotidiano.

O mito e as diversas formas de ficção podem suprir os vazios da capacidade intuitiva da criança, vazios estes provocados pela sociedade moderna e pelo próprio processo civilizatório, que no afã de conquistas materiais, deixam esfumaçar as· capacidades humanas contidas nas suas origens. Por isso diz-se não existir limites temáticos no teatro para crianças. Na idade em que uma criança começa a frequentar o teatro, pensamentos e sentimentos como culpa, amor, ódio, inveja, competição, medo, alegria, tristeza, duvidas, não são nenhuma novidade, porque ela já os experimentou e continuará experimentando.

O desafio está em fazer com que a linguagem apresentada atinja o nível de entendimento no qual criança se encontra.

Ao mostrar as situações, o teatro buscará formas diversas, onde devera ocorrer a identificação com a criança. Esta identificação com as personagens, com o conflito, com os símbolos e signos é fundamental para que a comunicação se estabeleça.

Idealiza-se que o teatro possa fornecer a criança condições ou elementos intelectuais, morais e éticos que colaborarão na sua formação integral. As situações e os conflitos, ao serem resolvidos, levam – ­na a formular conceitos e a ampliar seus valores sensíveis e mentais. Isso tudo esta evidentemente condicionado ao grau de competência e seriedade empregado no processo de criação e elaboração dos espetáculos.

Buscar uma linguagem no teatro infantil e buscar a própria criança, ou seja, conseguir penetrar na linguagem de suas experiências, traduzindo-as para o palco.

O tema teatro para crianças e todas as suas variantes tem sido debatido pelos artistas há muito tempo e em diferentes momentos e situações. Meu envolvimento com as reflexões deste fazer artístico, que tem suas especificidades, vem desde os encontros nacionais promovidos pelo Teatro Guairá, em Curitiba, em meados da década de 70.

Fiquei muito feliz do 10° Fenatib. Estamos vivendo um outro momento quando nos reunimos para refletir sobre os temas que o assunto levanta e igualmente quando analisamos os espetáculos. A percepção dos criadores hoje é bem diferente e o amadurecimento das posturas e­ opções é notável.

Quando os grupos que se dispuseram se colocavam e os debatedores convidados expunham suas apreciações, ocorria uma verdadeira relação de troca e cumplicidade nas inquietações. Dito assim parece óbvio, mas convém esclarecer que esta relação, em outros tempos, era e precisava ser de conscientização básica daquilo que hoje me parece muito mais evoluído.

O grupos selecionados trouxeram para o Fenatib trabalhos que valorizavam o processo criador, as opções de linguagem e a busca por expressões autenticas.

Isso nos faz crer que a premissa de que fazer teatro para crianças é igual fazer teatro para adultos, só que mais difícil, tem sido um exercício consciente e prazeroso dos grupos.Tão prazerosos quanto os encontros importantíssimos que acontecem Blumenau.

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Fátima Ortiz
Autora teatral

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Obs.
Texto retirado da Revista FENATIB, referente ao 10º Festival Nacional de Teatro Infantil de Blumenau (2006)