Matéria publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Eliana Yunes – Rio de Janeiro – 27.09.1986

Barra de Divisão - 45 cm

Folclore Vivo

O hábito não faz o monge, nem a data esgota a festa. Não importa se o mês do folclore passou: um programa bonito é visitar com as crianças o Museu do Folclore Edison Carneiro, na saída Palácio do metrô Catete. Num espaço relativamente pequeno está montada com extremo bom gosto e seriedade uma mostra de como vive e o que produz o homem brasileiro.

Sem privilegiar uma região ou área cultural, o museu, em seus dois andares, apresenta conjuntos integrados de atividades espalhadas por todo o país, reunidas por tema ou linguagem. Assim, no primeiro momento, a mostra oferece
uma representação dos ritos de passagem, isto é, as cerimônias que marcam os diferentes momentos de crise no ciclo da vida – nascimento, puberdade, casamento e morte. Em barro e madeira os artistas expressam sua visão destes
momentos com singeleza e perspicácia. Segue-se o mundo ritualizado das festas em que o colorido dos vestuários, adornos e adereços do Bumba-meu-Boi, das Folias de Reis e do Divino, do Maracatu e do Carnaval, entre outras têm uma representação atraente. Três salas especiais reconstituem o ambiente de produção cultural do homem brasileiro na transformação da natureza: uma casa de farinha, os instrumentos de trabalho de um pescador, e de um vaqueiro
exemplificam a passagem dos materiais naturais em produtos culturais.

Já no segundo andar, está a parte mais rica do museu pela variedade e qualidade das peças expostas, que levam a assinatura de artesãos que já têm renome internacional. Não, não é uma contradição: o indivíduo criador que produz o que se denomina arte do povo, não é anônimo, nem a-histórico. Recebido o legado de seu grupo cultural, ele reelabora e exprime sua contemporaneidade no trabalho artesanal. A mostra começa com as rendeiras e seus diferentes teares, com as diversas rendas, do filé ao bilro. O traçado de palha, das cestas aos abanicos e a vez da cerâmica do Vale do Jequitinhonha (MG) ao Maragogipinho (BA). Lá estão as areias coloridas engarrafadas pelos artistas de Timbau (RN) e as esculturas fantásticas de GTO, Valentim Rosa, Laurentino que trabalham pedras-sabão e madeiras de tipos diversos. Há pintores primitivos diversos cujas obras representam bem o impacto da civilização industrial sobre seus
trabalhos e são representativas do processo histórico nas artes populares.

O Museu Edison Carneiro apresenta uma visão dinâmica e viva do folclore brasileiro e permite aos visitantes um descobrimento das ricas tradições culturais do país, submerso na rede de comunicação eletrônica. O folclórico não
é apenas o sui generis, o exótico, mas corresponde às maneiras de se expressar nas populações, desde o hábito de vestir, às formas de lazer, às comemorações comunitárias, até a reverência às divindades, concebidas e processadas pelo
grupo humano de que são signo das necessidades e solução cotidianas, no nível do real e do imaginário.

O museu está aberto sábados e domingos entre 15 e 18h e a visita é extremamente didática, mesmo sem guias. Há pequenas cartelas explicativas de cada conjunto presas na parede, e a leitura delas é bastante elucidativa. Um pequeno
auditório para projeções de vídeo e audiovisual completa o circuito que pode terminar no Museu Parque da República, bem ao lado, para curtir o patrimônio histórico em natural.