Um elenco com muitas crianças e adolescentes mostra-se muito compenetrado em seu trabalho e garante grande empatia com a plateia também cheia de crianças

Crítica publicada em O Globo – Segundo Caderno
por Marília Coelho Sampaio – Rio de Janeiro – 24.11.2003

 

 

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A Arca de Noé: Apesar dos vídeos redundantes, um espetáculo sob medida para seu público alvo

Canções e colorido que contagiam

O musical A Arca de Nóe, inspirado no livro de poemas de Vinicius de Moraes, em cartaz no Teatro Villa-Lobos, é um incontestável sucesso de público. O espetáculo, com texto e direção de Augusto Thomas Vannucci, faz duas sessões aos sábados e aos domingos, às 15h e às 17h, com casa lotada. Não por acaso, a plateia está repleta de crianças bem pequenas que são facilmente contagiadas pela vivacidade dos números musicais, pelo colorido do figurino e pelos atores mirins que ocupam o palco.

O fio condutor da história é a menina Maria, que, depois de um breve desentendimento com seu pai, motivado por sua desatenção na escola, vai para o quarto estudar. E como ela precisa fazer um trabalho sobre A Arca de Nóe, acaba levando para cama e, consequentemente, para o sonho, suas preocupações. O resultado disso é que durante a noite ela acaba vivendo uma fantástica aventura, que inclui Noé e os animais que ele transporta em sua arca.

Elenco com muitas crianças dá conta do recado

A Arca de Noé reúne 18 atores, num elenco formado em grande parte por crianças e adolescentes. E eles estão todos muito compenetrados em seu trabalho, dando conta direitinho do recado. Nesse elenco mirim, não se pode deixar de falar da menina Nathália França, que interpreta Maria. Ela demonstra um grande potencial para a carreira artística e, principalmente, para o canto: tem uma bela voz e é muito afinada.

Entre os adultos, destaca-se Izabella Bicalho, que interpreta o macaco. Além de uma bela voz, demonstra toda uma preocupação com o trabalho corporal, que é muito bem realizado. Kadu Garcia, que vive Noé e a Porta, e Raul Serrador, Pai e Carlitos, estão bem em seus pequenos papéis.

Mas algumas observações não podem deixar de ser feitas sobre o espetáculo, principalmente em relação à direção de Augusto Thomas Vannucci. O material de divulgação do espetáculo diz que é utilizada uma “mistura das linguagens do teatro, do cinema e do circo para dar ao musical o ritmo ao qual as crianças de hoje estão habituadas”. Se é assim, deve-se dizer que a procura de tal ritmo nem sempre é bem-sucedida no palco.

Parece que existe atualmente uma tendência na produção do teatro infantil carioca de utilizar a técnica do vídeo na cena. Algumas vezes, isso é feito com muito sucesso. Mas, no caso de A Arca de Noé, esse recurso, que certamente encarece a produção, poderia ser descartado. No musical, as, projeções competem o tempo todo com o que se passa no palco, chegando em algumas cenas, como a das abelhas, a do porco ou a do pai com a menina, a serem redundantes: não há sentido em mostrar na tela o que já está sendo encenado no palco. Nada contra os vídeos, que até são bem feitos. O problema é que eles são redundantes.

Já o recurso dos bonecos, confeccionados por Ricardo Denner para mostrar a caminhada da menina e de seus companheiros, está bem encaixado na peça. O cenário de Rosa Magalhães funciona adequadamente no espetáculo, o colorido dos figurinos de CarIa Reis preenche o vazio do grande palco do Villa-Lobos, e a iluminação de Rogério Wiltgen e Eduardo Salino parece recriar o clima circense pedido pelo diretor. As coreografias de Caio Nunes são compatíveis com as possibilidades do jovem elenco e a direção musical de André Protásio, competente. Em seu conjunto, A Arca de Noé agrada bastante ao público.