Leonardo Vieira é Zorro nos jardins do Palácio do Catete. Foto Fernando Rabelo

Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 25.05.1997

 

 

Barra

Suspense é só para o elenco 

Don Diego de La Vega é um almofadinha que vive na Califórnia de 1820 – época em que aquelas terras estavam sob intervenção espanhola – muito tranquilo em sua hacienda, aos cuidados do criado Bernardo. Quando as coisas apertam naquelas plagas, entra em cena Zorro, o herói mascarado, que depois de assustar o vilão, beijão a mocinha e riscar por toda a aldeia o Z, sua marca registrada, volta a ser o bon vivant de sempre.

A dupla identidade, pelo menos na ficção, sempre foi um recurso muito apreciado pela plateia de qualquer idade. Na galeria de heróis mascarados, decolaram para a fama: o outro Zorro, o companheiro de Tonto, que só atirava com balas de prata e gritava “aiôôô, Silver”, o Batman, identidade secreta de Bruce Wayne, e o Morcego Vermelho, uma transformação do Peninha. A ideia de enganar todo mundo, menos o público, que sempre sabe quem é quem, é a mesma usada por Hitchcock quando faz suspense só para os demais personagens. Nos dois casos, a plateia é cúmplice.

Zorro, em cartaz no Museu da República é uma ótima ideia de Gaspar Filho de trazer para aqueles jardins a saga do herói mascarado. Com uma aldeia cenográfica montada com todo requinte por Emily Pirmez, o clima mexicano/espanhol – com suas casinhas geminadas e pintadas em cores, e uma taberna, toda adereçada em palha – está em cena completamente ambientado ao local. O elenco de 40 atores, com figurinos de Luciana Maia marcando a época, música ao vivo e iluminação cheia de climas, realmente transporta o espectador para dentro da fantasia. Mas como teatro não tem close nem corte na edição e o som consegue ser mais precário do que o do cinema brasileiro, o que poderia ser um grande espetáculo se perde no ritmo lento da encenação.

O texto de Maria Clara Machado conta uma história que, mesmo sem ser ouvida, chega aos olhos do espectador em bonitas cenas, somente para serem apreciadas pela plasticidade, ficando o melhor de tudo com as cenas musicais ou as representadas quase no meio da plateia.

O elenco, que mistura atores iniciantes de todas as idades, tem Leonardo Vieira no papel do protagonista. E este, decerto, é o principal motivo da lotação esgotada do espetáculo. Mas mesmo dentro do maior esforço para subir e descer agilmente as escadarias dos cenários e manejar com certo charme a esgrima, ganha a simpatia do público o Sargento Garcia, interpretando por Rafael Molina. Ele e Cícero Marques, também do Tablado, no papel do criado Bernardo, compõem os melhores personagens da montagem.

Mesmo com todos os problemas, Zorro é um espetáculo com a assinatura de Gaspar Filho, um diretor que tem caracterizado o seu trabalho em espaços abertos com muita qualidade. São dele Robin Hood, encenada nos jardins da PUC, e Sonho de uma Noite de Verão, no Museu da República, peças que correndo na contramão do teatro convencional conquistaram platéia. Desta vez, porém o diretor conta com um elenco muito inexperiente para sustentar um espetáculo de tão grande porte. Mas como a temporada de Gaspar Filho costuma ser longa, é só uma questão de dar tempo ao tempo.

Cotação: 2 estrelas (Bom)