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Crítica publicada no Jornal do Brasil – Caderno B
Por Lucia Cerrone – Rio de Janeiro – 01.06.1994

 

 

 

 

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Em clima de auditório

Como dizem por aí os mal humorados de plantão, o teatro dirigido ao público adolescente tem uma fórmula: atores de novela + conflito com autoridade+ sexo, drogas e rock and roll = público. Zero de Conduta, texto escrito por Zeno Wilde atendendo encomenda da Faria – Vasconcelos Produções tem um pouco disso tudo e, é claro, resultado. Porém o que está em cena, até que provem o contrário, é a vontade de jovens atores da TV de provar seu talento no palco, sem os cortes da edição. E a vontade tem que ser muita, quando se tem pela frente uma plateia que urra a cada entrada de um ator mais conhecido e um texto com elementos complicadores como o de Zeno Wilde.

Wilde é o mesmo autor de Blue Jeans, uma peça que falava, entre outras coisas, sobre a prostituição masculina, e que poderia ser ambientada em qualquer cidade grande do mundo. Seu texto Zero de conduta trata da obrigatoriedade do serviço militar no Brasil, mas parece localizar a ação em West Point. Muito inspirado em filmes de tortura militar, daqueles em que os soldados sempre respondem ao sargento usando a mesma expressão – “senhor, sim senhor!” -, um tom acima do aceitável, o texto ganha intimidade com os fãs do gênero, na mesma medida em que perde contato com a realidade que deveria contestar.

Sete jovens, bonitos e saudáveis, são convocados ao serviço militar para o qual não tem nenhuma vocação. Com tipos bem marcados, cada um reage à sua maneira à autoridade imposta. O final trágico é diluído pelo anticlímax, com a comemoração pela baixa. O pressuposto de que todo machão é homossexual é uma justificativa preconceituosa para a ação violenta dos que comandam. Muito interessante, no entanto, é o epílogo quase poético sobre o absurdo da obrigatoriedade do serviço militar, e os benefícios que trariam o voluntariado.

A direção de Pedro Vasconcelos, para os muitos monólogos e alguns diálogos, entremeados pela excelente coreografia de Cláudio Moreno, mostra um espetáculo de ritmo oscilante, saindo-se melhor o elenco nas cenas de conjunto. No palco, André Gonçalves, Fernando Almeida, Nico Puig, Marcelo Faria e Pedro Vasconcelos vivem seus personagens procurando dar maior veracidade possível a trama de Wilde, Alethea Miranda, num papel episódico, não chega a comprometer a encenação. Alexandre Garcia, o sargento da companhia, carrega no tom austero, sem muitas nuances, e Cassiano Carneiro conhecido por seu humor anticonvencional, não alcança neste espetáculo o mesmo resultado de outros trabalhos.

A encenação tem elementos bem cuidados que se destacam, como a música de Marcio Mello e os figurinos funcionais de Álvaro Simões e Pedro Vasconcelos. Os cenários de Paula Joory – um telão com a bandeira do Brasil estilizada e alguns bancos que se transformam conforme o ambiente- agilizam as cenas na medida exata. Também de bastante efeito, a iluminação de Adriana Ortiz cria os climas exigidos pelo texto.

Zero de Conduta é um espetáculo que, mesmo sem intenção, provoca no público uma excitação quase incontrolável. O clima de auditório que se instaura na plateia pode atrapalhar não apenas os atores no palco, mas também alguns espectadores interessados na encenação. De qualquer maneira, é fantástico, nos dias atuais, ver um teatro lotado.

Zero de Conduta está em cartaz no Teatro Ipanema, as quintas e sextas-feiras, às 18h30. Ingressos a CR$ 9.000.

Cotação: 2 estrelas (Bom).