Cena de Uma peça por Outra, de Jean Tardieu, em cartaz no Aliança Francesa

Critica publicada na Folha de São Paulo
Por Aimar Labaki – São Paulo – 22.08.1987

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Uma peça que vale por muitas

Se você quer se divertir, essa é sua peça. Se você quer refletir sobre essa ilusão que é o “homem moderno”, também. Se você quer assistir mais uma lavagem de roupa suja entre os que fazem teatro e os que teoricamente são os seus companheiros de ofício, idem.

Uma Peça por Outra é uma reunião de textos curtos de Jean Tardieu, autor francês, que Eduardo Tolentino estruturou e dirigiu. Tolentino resistiu à tentação de usar os textos apenas como suporte para os excelentes atores que tem, preferindo também dar um sentido à ordem que elaborou para eles. As cenas fazem um percurso que vai do realismo ao “teatro de sensações” que sucede ao chamado teatro do absurdo. No centro de tudo, as convenções teatrais sendo desmascaradas como uma forma de iluminar a falência das convenções sociais.

Ironizando as opções definitivas em arte ou brincando com o valor relativo das palavras, Tolentino casa sua capacidade de fazer teatro “careta” com o compromisso com a experimentação. Ele talvez seja o diretor de sua geração com maior capacidade de armar um espetáculo nos moldes tradicionais, coisa que já demonstra no belíssimo O tempo e os Conways. Mas, para além disso, ele continua levando sua reflexão com a liberdade de quem não se sente obrigado a provar que é “moderno” ou sério.

Os cenários de Ricardo Ferreira e os figurinos de Lola Tolentino, além de belos, colaboram na alternância de tons entre as cenas. A utilização de um piano ao vivo, além de criar o clima desejado, entra no jogo cênico de uma forma que seria impossível com a utilização de fita gravada.

Elenco irrepreensível

Num elenco irrepreensível destacar alguém é injusto. Sejamos injustos. Eliana Fonseca reafirma-se como uma das melhores atrizes saídas nos últimos anos da EAD. Denise Weinberg, nas cenas em que participa, não atua, reina. Que os nomes dos outros excelentes atores não passe em branco: Charles Myara, Clara Carvalho, Brian Penido, Ernani Morais, Guilherme Santana e José Carlos Machado.

É fascinante você ver funcionar recursos envelhecidos pela má repetição, como o diálogo direto com a plateia ou com atores plantados nela. Na estréia um excesso de cenas, aliado a um ritmo ainda não preciso, levou Eduardo a um corte drástico no espetáculo, resultando disso uma peça recomendável para qualquer tipo de público.

Com esse trabalho o grupo Tapa dá mais uma chance ao público paulista para descobrir um dos melhores trabalhos contínuos de teatro do Rio de Janeiro. Que os paulistas estejam à altura de mais essa chance.

Serviço:
Uma Peça por Outra – de Jean Tardieu. Direção: Eduardo Tolentino de Araújo. Com Charles Myara e Denise Weinberg. Teatro Aliança Francesa (rua General Jardim, 182, telefone 259-8412, zona central). De quinta a sábado, às 21 horas. Domingo, às 19h. Ingresso: Cz$ 150,00 (quinta), Cz$ 200,00 (sexta e domingo) e Cz$ 250,00 (sábado).