Crítica publicada no Site da Revista Crescer
Por Dib Carneiro Neto – São Paulo – 16.04.2013

Barra

O cabelo do diabo e o medo de barata

Duas boas peças para crianças saem de cartaz neste fim de semana. Programem-se, pois vai valer a pena não perder. São bem diferentes.

Vou falar primeiro de Três Fios, da Paideia, com direção de Amauri Falsetti. Neste ano, o grupo já nos brindou com a excelente Miliúma, baseado na história de Xerezade. Agora, também na linha de recriação de contos populares universais surge a ótima adaptação de Os Três Fios de Ouro do Cabelo do Diabo, dos Irmãos Grimm.

O espetáculo já nos fisga em seu início, uma espécie de prólogo em que todo o elenco surge vestido de lavadeiras à beira de um rio. Falsetti, diretor e adaptador, também acertou em cheio no recurso de fazer os atores se alternarem entre os mesmos papeis. Esse jogo intrigante é sempre saudável para atiçar a imaginação das crianças.

Gostei bastante dos figurinos, assinados por Laís Sue Wu e Marina Kenan. A coroa do rei, o vestido rosa da rainha e o colete do diabo são três exemplos de peças encantadoras, cheias de informação e criatividade. E, como sempre, a companhia se esmera na escolha das canções infantis populares para a trilha.

Para quem não conhece o conto, o enredo gira em torno de um rei malvado que tenta impedir uma profecia: não quer que sua filha se case com o moço pobre que nasceu envolto em uma membrana de sorte. Há uma deliciosa fluidez na narrativa, com ritmo, graça, medo, suspense, aventura e romance. Tudo isso. Não é à toa que os contos dos Irmãos Grimm sobrevivem pelos séculos.

A segunda peça que encerra temporada no fim de semana é Quem Apagou a Luz, do grupo República Ativa de Teatro, dirigido por Rodrigo Palmieri. Aqui, o estranhamento dá o tom do início ao fim. A dramaturgia de William Costa Lima é muito corajosa, por não ter um enredo linear e, em nenhum momento, se deixar engessar nas boas intenções da “moral da história” ou do “e foram felizes para sempre”. Como o próprio grupo explica no programa, são várias histórias, “que podem ou não fazer parte da mesma” e “sem apontar uma solução, mas levantar questões e admitir o diálogo”.

O tema básico do espetáculo é o medo: de escuro, de fantasma, de barata…  Há momentos em que a peça parece um espetáculo de dança contemporânea, daqueles em que os bailarinos se arrastam pelo chão. Há outros em que vira um show de sapateado à moda da Broadway. A música é sensacional, simplesmente porque é maluca, fugindo totalmente do padrão daquilo que a mídia chama de “canção infantil”.

Projeções de imagens animadas (parecendo gibi de adulto) completam o quadro desta montagem surpreendente, em que o cenário esplendidamente se baseia em luminárias de papel-arroz em vários formatos e tamanhos. Ah, e sem esquecer do figurino hilário das três criaturas de peruca (ácaros? vírus? bactérias?). Quem Apagou a Luz entra desde já na categoria dos espetáculos que mais ousaram em 2012.

Serviços

Três Fios

Paideia Associação Cultural
Rua Darwin,153 (Santo Amaro)
Tel. (11) 5522-1283
Sábado e domingo, às 17h
R$ 15,00

Quem Apagou a Luz

Teatro Cacilda Becker
Rua Tito, 295 (Lapa)
Tel. (11) 3864-4513
Sábado e domingo, às 16h
R$ 10,00

*Este texto foi publicado anteriormente em 09.11.2012, no Blog Pecinha é a Vovozinha.