Matéria Publicada no Jornal do Brasil, Caderno B
Página B3 (5 col. x 68 cm)
Por Ricardo Schöpke – Rio de Janeiro – 15.05.2010



Quando objetos comuns ganham vida no palco

Companhias brasileiras e internacionais criam um mundo de fantasia no 4º Fito, em Belo Horizonte 

Um amassador de batas vira um monstro; uma bota, o lobo mau; um saca-rolha, bailarina. A fantasia, que atravessa espetáculos e exposições, é a estrela do festival Internacional de Teatro de Objetos (Fito), realizado no último fim de semana, em Belo Horizonte.

Uma arte ainda pouco explorada em todo o mundo, o teatro de objetos foi criado na Europa, em março de 1980, pela francesa Katy Deville. Ela foi a responsável em classificá-lo como mais uma modalidade de expressão cênica teatral. No teatro de objetos todas as formas de manipulação e animação são permitidas. Um objeto pode representar a si mesmo ou se juntar a outras peças para criar um novo significado. Tudo é possível, e é isso o que garante a riqueza desta arte com tendência ao minimalismo e, em alguns casos, à miniaturização. Não é à toa que a maioria dos trabalhos é realizada em pequenos espaços cênicos. Como consequência, as companhias que se apresentam são quase sempre formadas por pequenas famílias de dois a três integrantes, sendo muito comum os trabalhos em dupla ou os monólogos.

É o caso do alemão Peter Kettkurlat e a sua Cozinha Louca, em que objetos de cozinha que transformam-se em seres fantásticos. Ou da companhia holandesa TamTam-objeck-tenthetater, que encenou  Ter ou não Ter. A brasileira Cia. Gente falante trouxe Louça Cinderella, um chá completo, com uma xícara de louça comum, da qual surge um universo fantástico de conto de fadas. Entre os monólogos, estão o grupo argentino Fernán Cardama que, com a sua Histórias de Meia-sola, extrai muita poesia e lirismo de sapatos de variados formatos; a companhia francesa Théàtre Cusine, da percussora Katy Deville, e o seu 20 minutos sob o mar; a companhia espanhola Rocamora e a peça Pequenos suicídios; à francesa Cie A e O Quarto 26, em que, através de alguns cartões-postais,  a atriz Dorothée Saysombat nos conta as suas histórias.

Bota, saca-rolhas, xícara: tudo vira arte no Festival Internacional de Teatro Objetos

Inicialmente voltado para adultos e posteriormente adaptado ao público infanto-juvenil, o gênero dialoga intensamente com as artes plásticas e a música.

– Essa arte educa o olhar e chama as pessoas a ver o cotidiano de forma diferente, amplificado pela imaginação – destaca Lina Rosa, a idealizadora e curadora do Fito, – O teatro de objetos está fincado no inconsciente coletivo. Remete a algo que todo mundo já fez quando criança: brincar dando vida a ossos, sabugos e pedras.

A frente de uma equipe de aproximadamente 100 profissionais, Lina comanda a transformação de seis carretas em uma grande estrutura, além de grandes pavilhões de variedades. O festival tem a missão de formar público e já circulou por Manaus (AM) e Porto Alegre (RS). Devido ao grande sucesso do Fito nas quatro edições realizadas até hoje, o Sesi, que é parceiro do evento, deve realizar mais mostras em  unidades de outras cidades. Nina comemora a possibilidade de fechar mais duas edições do Fito ainda no segundo semestre de 2010, em Florianópolis e em Brasília. Ela acredita que o festival promova a formação de plateias e de artistas, que possam, a curto prazo, produzir espetáculos com esta técnica. A qualidade dos profissionais brasileiros é atestada por integrantes de  companhias estrangeiras.

– Brasil é um país grande e cheio de possibilidades de  trabalho – enaltece a atriz  francesa Dorothée Saysombat, do espetáculo La Chambre 26 (O Quarto 26). – Não temos na França nada parecido com a estrutura do Fito. Além de que as pessoas daqui são muito receptivas e atenciosas.