Imensos mamulengos funcionam como narradores do espetáculo O Barbeiro de Sevilha, que mistura da ópera musicada por Rossini ao rico universo regional brasileiro

Matéria publica no Jornal O Globo
Por Mànya Millen – Rio de Janeiro – 05.04.1996

Barra de Divisão - 45 cm

Ópera com pitadas de bumba-meu-boi

Cia. Teatral Nosconosco estreia amanhã no Teatro Gláucio Gill sua nova peça – coproduzida pela premiada Eveli Ficher – que, como os trabalhos anteriores do grupo, mistura de forma séria a tradição da commedia dell’arte com o rico universo regional. Só que desta vez o produto chegou na embalagem de uma ópera. Ou quase, já que esta versão de O Barbeiro de Sevilha encenada pela companhia mantém a história escrita por Beaumarchais, mas utiliza apenas pequenos trechos da música composta por Rossini como vinhetas para o texto. Sem a menor pretensão de engrossar a temporada lírica da cidade, os adaptadores e diretores Roberto Dória e Célia Bispo preferiram reforçar o caminho que vêm seguindo há seis anos, desde que fundaram o grupo:

O Barbeiro de Sevilha é mais um passo nosso na direção de juntar dois universos  tão distantes e tão próximos – conta Célia. – Este texto é uma continuação da commedia dell’arte, recheado de arquétipos que também fazem parte da cultura brasileira. Só que realmente não dava  para trabalhar um texto tão identificado com a ópera sem inserir trechos da música.

Para narrar a história de um amor quase impossível de um conde por uma donzela que só dá certo graças ao auxílio de Fígaro, o barbeiro do título, os diretores mantiveram a estrutura já utilizada em O Arlequim, trabalho anterior da companhia. A história é contada por uma trupe de atores, formando um espetáculo dentro do outro, O miolo é mesmo O Barbeiro de Sevilha e seu enredo original, mas do lado de fora há a magia do bumba-meu-boi, das cantigas de roda há muito esquecidas e de mamulengos que narram a peça.

– O espetáculo é fruto de um trabalho de um ano inteiro e foi aprimorado e testado junto com todo o grupo – revela Célia Bispo.

No palco, 16 atores (entre eles a própria Célia e Roberto Dória) entrarão na pele dos personagens criados por Beaumarchais como Fígaro, D. Bartholo, a donzela Rosina, Almaviva e tantos outros. O premiado grupo também é responsável pela criação do cenário (assinado por Dória), do figurino (de Célia) e das máscaras e bonecos.

Uma produtora premiada

Eveli Ficher é uma garantia de qualidade

Se não bastassem os prêmios já conquistados pela Cia. Teatral Nosconosco, O Barbeiro de Sevilha também chega aos palcos com outro indiscutível selo de qualidade: a assinatura de Eveli Ficher na coprodução. Em apenas quatro anos atuando na área teatral, a historiadora e produtora conquistou fama e respeito com a idealização e concretização do belo “Projeto Andersen, o Contador de Histórias, uma trilogia que se encerrou no ano passado e deu à produtora o prêmio Mambembe como personalidade e o prêmio Coca-Cola de melhor espetáculo por O Patinho Feio.

– Eu sou muito exigente, quero qualidade e sei que acabei criando uma assinatura de produção mesmo – diz Eveli, que já havia prometido trabalhar coma a Cia. Nosconosco há algum tempo. – É uma responsabilidade muito grande. Recebi os prêmios ainda “foquinha” e até me assustei um pouco,mas tenho orgulho de ter meu trabalho reconhecido em tão pouco tempo de teatro.