Crítica publicada no Jornal dos Sports
Por Jota Efege – Rio de Janeiro – 23 .10.1948

O Casaco Encantado

Já tivemos, há alguns anos, por iniciativa do nosso saudoso confrade José Luiz Pulhano, então presidente da A.B.C.T., um teatro infantil. Uma “troupe” de garotos, ensaiada por Olavo de Barros, representava, e com brilhante êxito, para uma numerosa assistência de crianças. E, em meio destas, havia, sempre, adultos que eram frequentadores assíduos de tais espetáculos. Nós éramos um deles. Mais tarde, não há muito tempo, um grupo de atores austríacos se exibiu no Carlos Gomes e no Teatrinho Jardel apresentando peças para a petizada. Especializados no gênero eles lograram nas suas representações vultosa afluência e faziam a plateia delirar com as suas pantomimas. E, agora, numa feliz criação, Henriette Morineau, a quem muito deve a arte cênica nacional (apesar do chauvinismo pândego que anda por aí) resolveu, também representar para a gurizada. Domingo último, no Ginástico, numa récita levada a efeito na madrugada daquele dia e dedicada à crítica, lançou o seu “Teatro para Crianças”.

Lúcia Benedetti, a autora da peça de estreia, fez com o seu livro “Chico Vira Bicho e Outras Histórias” o seu primeiro contato com a criançada. Revelando-se excelente escritora do gênero, foi ela, agora, a escolhida para inaugurar as atividades do teatro infantil, idealizado por Henriette Morineau. O Casaco Encantado é uma história divertida, símile da “Bota de Sete Léguas”, onde aparecem uma bruxa horrenda, má, e um rei furioso que ameaça degolar todos os súditos que o contrariem. Há, também, o que seria imprescindível, uma fada meiga, bondosa. E, desse modo, torna-se, inegavelmente, um espetáculo talhado para o fim que se destina. As complicações que perseguem os dois alfaiates José e João atrapalhados com a confecção de um casaco para o seu monarca, hão de fazer a criançada rir, e muito, não temos dúvida. Já na récita dedicada aos críticos, essa hilaridade se constatou. Os “marmanjos” deram estrepitosas gargalhadas quando a Sra. Morineau figurando a bruxa má foi aprisionada pelos sagazes costureiros.

Representando para uma plateia infantil é lógico que os intérpretes têm que usar uma técnica própria, as suas personagens devem ter todas as características que a tornam o mais possível intuitivas. É necessário, até, o abuso da mímica, a excentricidade circense em muitas sequencias. E isso nota-se que foi sentido e observado pelo diretor do espetáculo, o ator Graça Melo. Todos os artistas, que vêm fazendo um teatro de alta classe, onde se lhes exige apuro e sobriedade, apresentam-se perfeitamente integrados na nova qualidade de espetáculo que lhes confiaram. Passaram de um gênero para outro, com uma maleabilidade surpreendente. Não destacaremos, e isto para sermos justos, o nome de nenhum deles. Todos do elenco, a partir de Maria Castro, que faz a Vovozinha, saíram-se esplendidamente. A eles pois, os nossos calorosos aplausos, os efusivos parabéns a que fizeram jus.