Paloma Riani e Raul Serrador revivem o mito grego

Matéria publicada na Tribuna da Imprensa
Por Vilma Homero – Rio de Janeiro – 10.10.1987

 Barra de Divisão - 45 cm

Eros e Psique

Uma História de Amor Para os Adolescentes

O que uma história da clássica mitologia grega tem em comum com uma plateia adolescente? Para o Grupo Tapa tem tudo a ver. Afinal, os clássicos tratam das emoções e paixões do ser humano, que pouco mudaram nestes últimos 2.500 anos, e começam a entrar na vida dos jovens que vivenciam seus primeiros amores. Em Eros e Psique, a peça que o Tapa leva na Casa de Cultura Laura Alvim, a partir do dia 13, a atualidade e a universalidade do mito grego é mais uma vez posta à prova.

Em cartaz até dezembro, com possibilidades de prorrogação, Eros e Psique foge um pouco à regra que o grupo vinha mantendo de levar ao palco e às escolas onde costumam apresentar textos de autores nacionais com os quais mostram a trajetória da dramaturgia e literatura brasileiras. Depois das adaptações de O Alienista, O Noviço e Caiu o Ministério, no ano passado, e de O Homem que Sabia Javanês, do início de 87, o Tapa retoma um tema universal, presente no inconsciente coletivo de todos nós: o amor, a paixão.

O amor entre o deus Eros e a mortal Psique, amaldiçoado por Vênus, a mãe enciumada de Eros, parece de encomenda para fazer bater mais rápido os corações adolescentes que compõem grande parte do público do grupo. Porque foi em parte pensando neles que os atores decidiram buscar um texto que também tivesse uma maior identificação com as questões e preocupações que vivem os jovens.

Isso não significa que abandonamos o Festival de Teatro Brasileiro. O projeto, através do qual nestes últimos três anos temos levado o teatro principalmente às escolas, continua de pé. Neste meio tempo, conseguimos formar um público que agora já vai ao teatro especialmente para ver o nosso trabalho – explica André Costa, o Mercúrio da peça.

Sem ser uma mudança no rumo do grupo, Eros e Psique é na verdade, a continuação de um projeto que deu certo. O espetáculo, que por sua maior sofisticação técnica exige a estrutura de um teatro para ser encenado – não mais a peça “portátil”, pronta a ser levada de escola em escola pelo grupo – significa também um aprofundamento do trabalho do Tapa.

– O grupo está crescendo. Não só em termos numéricos, já que dos integrantes iniciais –  que eram cerca de 10 – agora somos quase 40, divididos em montagens simultâneas no Rio e em São Paulo, onde estamos em cartaz com a peça infantil Pinóquio. O nosso trabalho também está crescendo profissionalmente. Das adaptações de textos feitas por gente do grupo (O Alienista, por Renato Icarahy e Cláudio Bojunga; O Homem que Sabia Javanês, por Anamaria Nunes), partimos para a criação do texto a ser encenado.

André conta ainda que a formação dos atores está se desenvolvendo com mais este trabalho, já que alguns deles passaram a exercer novas funções. Renato Icarahy, por exemplo, além de autor também dirige o espetáculo, da mesma forma como Celso Lemos e Eduardo Wotzig dirigiram O Homem que Sabia Javanês, e Teresa Frota, em Eros, assina o figurino. Se em parte isso é um pouco consequência da grana curta- apesar do patrocínio da  Brahma, que há dois anos vem garantindo a continuidade do grupo – também contribui para o aprofundamento dos conhecimentos dos atores nos diversos aspectos do trabalho teatral.

Mas que não se pense que Eros e Psique se limita a mostrar apenas uma história de amor. Como autor do texto, Renato fez uma mudança no final da versão original. Ao invés de, como no mito grego, a humana Psique se transformar em imortal, passando a viver com Eros no Olimpo, é o apaixonado Eros que abandona sua condição de deus para se tornar mero mortal na Terra. “O amor, como eu vejo, diz Renato, é uma força transformadora”.

– Na minha concepção, prossegue – o amor morre em função de outro amor, mais humano, mais mortal, menos olímpico. Esta mudança foi em função de juntar dois mitos, o do crescimento, em que a separação do filho para formação de sua própria família é o rumo natural das coisas, com a história de Eros.

Na peça, também cabe a Mercúrio, o mensageiro dos deuses, um papel crítico com relação ao marasmo do Olimpo que em muito se assemelha, segundo Renato, à ordem vigente.

– Os mortais são como joguetes nas mãos dos deuses, sem voz ativa sobre suas vidas. O que quero marcar com a mudança no final é a transformação: os homens passam a ser responsáveis por seu destino.

No elenco de Eros e Psique estão André Costa (Mercúrio), Paloma Riani (Psique), Raul Serrador (Eros), Vera Barroso (Vênus) e outros 10 atores. Com a nova peça, o Grupo Tapa espera repetir o sucesso que já lhe conferiu 13 prêmios Mambembes. O Tapa estará na Casa de Cultura Laura Alvim em dias e horários alternativos: terças-feiras às 21 horas e às quartas, quintas e sextas, às 17h.

O amor morre em função de outro amor, mais humano, mais mortal, menos olímpico.

Projeto Escola

O Projeto Escola, com que o Grupo Tapa vem levando seu Festival de Teatro Brasileiro aos mais diversos colégios que solicitem sua apresentação, tem tido a maior receptividade de professores e alunos. Da parte dos professores, o trabalho do Tapa vem facilitando o ensino de textos literários considerados difíceis, como o machadiano Alienista. Para os alunos, adolescentes, em sua maioria, a ida do grupo às escolas significa um primeiro contato com a arte teatral.

Nos debates com que o Tapa sempre encerra seu espetáculo, a curiosidade dos jovens pelo teatro recém-descoberto é grande. Além das perguntas iniciais sobre a própria montagem e o desejo de saber se o beijo entre os atores “é mesmo de verdade”, começa a se despertar um senso crítico, aguçado por comédias de costumes, como foi o caso do próprio Alienista ou do Homem que Sabia Javanês.

Há casos também, que o interesse por um dos atores supera todas as expectativas, como aconteceu com Eduardo, que viveu o personagem central de O Noviço, encenado no Instituto de educação, tradicional escola do Rio. Quem conta é a professora Sara Marta Attié, que revelou que em suas turmas o sucesso do ator foi tamanho que sua presença foi exigida em todas as apresentações posteriores do grupo.

– Nem que fosse apenas nos debates, as nossas alunas queriam vê-lo de novo a todo custo. E ficaram decepcionadíssimas quando souberam que ele estava se dedicando à direção e por isso ficaria longe dos palcos um tempo.

A professora Sara Marta também é fã do grupo Tapa, só lamenta que o gosto pelo teatro não seja mais difundido e mais acessível. ”O teatro ainda é muito elitista, uma atividade cultural que deveria poder ser mais democratizada”, finaliza.