Matéria publicada em O Globo – Rio de Janeiro
Sem Identificação – Rio de Janeiro – 05.03.2008

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Começa, Começa, Começa

Entrega do Prêmio Zilka Sallaberry, atualmente o único no Rio a prestigiar o Teatro Infantil, será dia 11, no Jockey Clube. Quatro peças disputam a principal categoria.

Um imenso dragão verde toma conta dos palcos para contar, de forma divertida e lúdica, uma história sobre o heroísmo com inteligência e amor, sem violência. Não tão longe dali, em outro teatro, atores e bonecos vivem a saga do navegador Cristóvão Colombo, de sua infância à descoberta da América.

Uma velhinha resmunga, nhem-­nhem-nhem-nhem-nhem-nhem, e descortina para o público o universo de poesias de Cecília Meireles. Enquanto isso, a dupla de palhaçadas e risadas garantidas, Lasanha e Ravióli, chega com a corda toda para apresentar a Bela Adormecida.

As quatro tramas, que estiveram em cena em 2007 e devem voltar aos palcos este ano, algumas com data marcada, outras não, concorrem a Melhor Espetáculo pelo Prêmio Zilka Salaberry de Teatro Infantil.

A premiação, no próximo dia 11, às 20h, nos salões sociais do Jockey Clube Brasileiro, no Rio, é idealizada pelo CEPETIN (Centro de Pesquisa e Estudo do Teatro Infantil) e está em sua segunda edição. É a única hoje que contempla os espetáculos voltados para o público mirim no estado, em dez, categorias. “Este prêmio tem uma importância imensa para nós, por só existir ele. Valoriza um dos trabalhos teatrais mais importantes, o de se criar para crianças. Pelo teatro, elas podem fazer sua imaginação viajar. E isso desperta nelas o interesse de procurar suas vontades. A arte é o único caminho que conheço que oferece essa oportunidade”, defende a diretora veterana da trupe Navegando, Lúcia Coelho, que concorre em três categorias ao Prêmio Zilka Sallaberry: Melhor Espetáculo com O Ovo de Colombo (também na disputa de Melhor Ator, Melhor Cenário, Melhor Texto, Melhor Atriz e Melhor Iluminação); Melhor Direção; e Prêmio Especial por seus 40 anos dos 72 de vida dedicado ao teatro infantil.

A diretora de O Dragão Verde, Cacá Mourthé, diz que o Prêmio Zilka Sallaberry é a única tentativa existente hoje de se salvar uma espécie em extinção.

“O teatro infantil no Rio sempre foi dos mais inovadores. Com o fim das premiações e dos patrocínios, o cenário ficou árido. Desejo que este seja o início de uma nova era”, conta ela, que volta aos palcos do Teatro Tablado no fim deste mês.

“A peça foi escrita por Maria Clara Machado há 25 anos para meu filho, Pedro, e até hoje é atual. Lembro que a história deixou Pedro tão fascinado que a primeira palavra que ele falou na vida foi ‘draguei’. “É um texto com valores”, defende Cacá, que se prepara para levar ao teatro Viagem de Clarinha, uma adaptação de dois textos de Ana Maria Machado, e planeja para o segundo semestre um série de eventos no Tablado em homenagem à dramaturgia de Domingos Oliveira.

A divertida Mônica Biel, dupla de Ana Barroso há 17 anos como Lasanha e Ravióli, deixa de graça e fala sério quando o tema é defender as artes cênicas para o público infantil. “O teatro é um meio de comunicação fundamental para o desenvolvimento do ser humano, como forma de realizar suas fantasias e de compreender o mundo”, diz Mônica, que concorre com Ana à Melhor Espetáculo com A Bela Adormecida por Lasanha e Ravióli, Melhores Atrizes, Melhor Figurino e Melhor Texto (Mônica).

Famosas por recontar os contos de fada e dar uma nova interpretação a eles, as palhaças cuidam de todos os detalhes do espetáculo. Só delegam a outros parceiros a iluminação, a música e a confecção das máscaras. “É gostoso cuidar de todas as etapas. Cria uma multiplicidade artística. Eu e a Ana resolvemos trabalhar para criança adaptando contos de fada sob a óptica dos palhaços. Com isso abrimos a possibilidade de todos, nós e o público se relacionarem com a história”, conta Mônica.

Quem quase fica sem palavras para falar da indicação ao prêmio tendo dirigido Depois da Língua do Nhem…, é Eduarda Lourenço. Ao estrearem num pequeno espaço carioca depois de muitos ensaios na sala da casa da diretora, ela e sua parceira Poena Vianna, do Grupo Teatro de Agora (que conta também com Luciano Aires), quase caíram para trás ao saberem que a montagem era uma das quatro finalistas na categoria Melhor Espetáculo: “Nosso prêmio é estar no páreo. Somos três iniciantes, dedicadíssimo, mas iniciantes. O que procuramos nesta fase peça foi criar uma fabulação que unisse poesia, tirando o tom de declamação dos versos de Cecília Meireles. Temos o projeto de levar trabalho cada vez mais as escolas. Cabemos em qualquer lugar”, conta Eduarda, que prepara agora com sua trupe O Homem da Cabeça de papelão, de João do Rio, ainda sem previsão de estreia.

Para o fundador do CEPETIN e idealizador do Prêmio Zilka Sallaberry, Carlos Augusto Nazareth, a ideia é movimentar a vida artística do teatro infantil no Rio e, com isso, levar ao público peças com mais qualidades: “Engana-se quem pensa que fazer que fazer teatro para criança é mais fácil. Ela é um ser em formação, mais suscetível e muito sensível. As experiências não passam incólumes, por isso devem ser boas. O que o CEPETIN quer é justamente dar as montagens infantis mais credibilidade e qualidade.

Prêmio Paulista só em abril

Até 2006, a única premiação cultural voltada exclusivamente às montagens infanto-juvenis no Brasil era o Prêmio Femsa de Teatro Infantil e Jovem. Em sua 15ª edição, o evento premia no fim de abril em São Paulo os melhores espetáculos e profissionais teatrais que atuaram no segundo semestre de 2007, em 17 categorias. “É o Oscar deste segmento teatral”, compara a coordenadora do projeto, Luiza Jorge.

O Prêmio Femsa surgiu da inexistência de ações ligadas ao teatro para crianças e adolescentes – essenciais para incentivar o trabalho de profissionais ligados ao setor. Hoje é um dos mais importantes para a classe. Com uma comissão julgadora formada por críticos de peso da capital paulistana, o prêmio já destacou o talento de grandes nomes.

Luiza afirma que o prêmio contribuiu para o crescimento do teatro jovem, eixo fundamental para a formação do público teatral: “Até poucos anos a produção para crianças acima de 12 anos era escassa. Em função do prêmio, há um maior foco nos adolescentes”. Nesta edição concorrem ao prêmio de Melhor Espetáculo Jovem as produções Bate Papo e Cidadão de Papel.

Na categoria Melhor Espetáculo Infantil estão João e Maria, Peter Pan e Wendy, Othelito e Fábulas.

Um infantil, com muito orgulho.

Não fazer do teatro infantil uma vitrine para o começo da carreira nem achar que o gênero é menos importante. Sobretudo, ter afinidade com a linguagem.

Essas são as premissas básicas que um dos maiores nomes da dramaturgia nacional, a atriz Sura Berditchevsky, lista para falar de sua paixão. “Fico louca quando um ator diz que está fazendo um infantil, como se fosse um trabalho menor. O teatro infantil é muito sofisticado, exige o exercício da síntese e jogos de palavras, com profundidades e compreensíveis ao universo daquele público”, conta ele, que trabalha sem parar para os pequenos. Sura leva aos palcos do OI Futuro, em junho, a adaptação do livro Um garoto chamado Roberto; de Gabriel Pensador, adapta para o teatro seu livro Amor de Cão; e monta o piloto de um programa infantil cujo elenco será todo formado por crianças e jovens saídos da Companhia de Teatro Sura Berditchevsky.