Sandra e Tadeu, numa montagem milionária

Crítica publicada no O Estado de São Paulo – Caderno 2
Por Tatiana Belink – São Paulo – 07.11.1987

Bela, Deslumbrante

De todas as versões teatrais de A Bela Adormecida que passaram pelos nossos palcos, e não foram poucas, só no ano passado tivemos nada menos que três, esta que se apresenta no Teatro Bandeirantes é de longe a mais espetacular. Trata-se de uma superprodução milionária, uma montagem de dois milhões de cruzados, vinda de vitoriosa temporada carioca, com disposição para deslumbrar as plateias infantis paulistanas. E deslumbrar ela consegue, deslumbrar e divertir, quiçá mais do que emocionar.

Por outro lado, talvez seja querer muito, isto de emocionar, de um espetáculo tão grandioso, psicodélicamente colorido e movimentado, que chega a quase afogar a singela história de princesinha do Bois Dormant, de Perrault, ou da Dornroeschen, dos Grimm, de tanta coisa que acontece naquele palco enorme.

A verdade é que o Teatro Bandeirantes não é a moldura ideal para um espetáculo infantil, com sua visibilidade deficiente e acústica idem, o que obriga o diretor a usar trilhas sonoras fortes, com prejuízo das vozes e das falas

Perde-se a “intimidade” do teatro, do “contar uma história”, em favor de uma espetaculosidade de show ou de rico balé estiloso, que não dependem de falas. Um show ou balé, sem dúvida muito bonito, caleidoscópico, dinâmico, com belos cenários que se trocam em poucos segundos, com figurinos lindíssimos, “clássico-rico”, efeitos especiais quase cinematográficos, sons, luzes, fumaças.

A peça tem ainda uma porção de encantadores personagens, inesperados por não fazerem parte da história conhecida das crianças, como os fofos bichinhos da floresta, amigos da princesinha; ou do ótimo bobo-da-corte e as alegres fadas madrinhas, que dão o toque de humor. E a fada-bruxa imponente com seus malvados gnomos-corcundas, que o herói tem de vencer em memorável cena de espadachim pra Zorro nenhum botar defeito. E, last but not least, um enorme dragão que deita fogo e fumaça pelas fauces hiantes, também devidamente derrotado pelo belo e ágil príncipe, muito bem defendido por André Felipe. E muita coisa mais, como um baile na corte e outras elegâncias.

Myriam Rios, a produtora, empenhou-se em apresentar um espetáculo fora de série, cheio de magia e encantamento, sem poupar esforços nem recursos, com gente de tarimba e competência em todas as áreas, e com ela mesma no papel-título, para o qual conta o physique du rôle perfeito. O resultado é uma montagem de gabarito incomum, que precisa ser vista.

Confesso que senti falta daquela “cumplicidade, daqueles maravilhosos momentos de silêncio do público, quando a plateia de crianças vibra, de respiração suspensa, na mais autêntica das “participações”: aquela do coração e da mente…