Crítica publicada no Jornal do Brasil
Por Flora Sussekind – Rio de Janeiro – 05.04.1985

Vinícius de Moraes para Crianças

Elvira Rocha é uma das poucas produtoras teatrais interessadas especialmente em teatro infantil. E em espetáculos do nível de Flicts ou A Fada Que Tinha Ideias, duas de suas melhores produções. Depois de um ano de parada tática, esperando o aparecimento de algum texto novo, resolveu estrear A Arca de Noé, baseado nos conhecidos poemas para crianças de Vinícius de Moraes.

E transformados recentemente em especiais pela TV Globo com grande sucesso. Não é de estranhar, então, o seu reaproveitamento teatral. Meio na esteira de um sucesso que já se tem de bandeja. Via Vinícius e via especial de televisão. Aparentemente, ao menos, a produtora Elvira Rocha desistiu dos altos voos a que se propunha no período de sua parada tática e preferiu uma solução mais comercial.

A opção por uma montagem de mais fácil retorno financeiro não é, evidentemente, nada condenável. Sobretudo se pensamos que o sucesso de A Arca de Noé pode gerar muitos outros espetáculos. O que incomoda um pouco a quem assiste ao espetáculo recém-estreado no Teatro dos 4 é que a certeza da fácil comunicação do texto de Vinícius com o publico parece paralisar tanto os atores quanto a diretora Alice Viveiros de Castro. Sem muita inventiva, movem-se quase sempre de maneira idêntica, homens para um lado, mulheres para o outro, e recitam como se fossem um simples coral ou um grupo de declamadores de poesia. E, como os poemas, excessivamente onomatopaicos e de ritmo bem marcado, dialogam sem problemas com o público, o desenho estreito do espetáculo não parece causar maiores problemas.

A atenção se mantém e a plateia francamente simpatiza com essa Arca de Noé teatral. Os atores e a direção, espertos, percebem a quem devem tanta empatia e finalizam o espetáculo com um estandarte piegas em homenagem a Vinícius de Moraes. E se a intenção é obter aplausos fáceis, conseguem. Pena que, antes mesmo de iniciar a representação, eles já tivessem sido conquistados. Via livro, disco e TV. O teatro funcionando exatamente como aquele que pega carona no sucesso alheio.

Não que falte talento a Alice Viveiros de Castro, uma boa atriz iniciando a carreira de diretora, ou ao elenco, onde De Bonis, Marcelo Escorel e Lygia Diniz tem alguns bons momentos. Faltou foi inventiva a Sérgio Oliveira nos adereços, mais uma vez limitados a longos chapéus, como vem fazendo desde A Fada Que Tinha Ideias, e à coreografia de Renato Castelo, que poderia dar muito mais vida ao espetáculo e tirar-lhe o tom de recital. E, coisa previsível numa diretora estreante, Alice Viveiros de Castro se limitou a “limpar” o espetáculo, sem maiores ousadias nas marcações ou na interpretação dos poemas mais que conhecidos de Vinícius. O que torna A Arca de Noé uma montagem correta e nada mais.